Seja qual for a obra de arte, ela nunca é criada apenas pela razão ou pela emoção, assim é Unidas pela Esperança. É quando estas duas se unem que o resultado final atinge algum nível de beleza. No entanto, é preciso que cada uma esteja na dose certa. Eis o problema da obra que analiso. Não que seja desmedido prejudicando o equilíbrio, pelo contrário, é que faltou razão para dar conta de problemas técnicos e emoção para lidar com temas que exigiam uma sensibilidade mais apurada.

É mais ou menos esse o tom que rege a história de Unidas pela esperança. O filme é baseado na história real do “coro de esposas de militares”. Um grupo de mulheres formado com o objetivo de ter um simples hobby na ausência dos maridos designados a missões no Afeganistão, mas que no fim se torna algo muito maior. Com esse material em mãos, o diretor Peter Cattaneo (de Ou Tudo ou Nada) entrega um filme que não é excepcional, mas está longe de ser ruim graças à presença das duas protagonistas, Kate (Kristin Scott Thomas) e Lisa (Sharon Horgan), que conduzem o coral a partir de uma interação bastante divertida proveniente de suas personalidades diametralmente opostas.

As primeiras cenas já deixam claro o forte contraste entre Kate e Lisa. A primeira age de acordo com o posto de seu marido, rígida e formal, enquanto a segunda é mais despojada e pouco apegada a ordens ou regras. Essas duas serão as responsáveis por orientar o grupo de mulheres que almejavam algo mais do que apenas a alcunha de “esposas”. O diretor tem a missão de lidar com esse dilema: mostrar a história de mulheres que não querem ser vistas apenas como “esposas”, mas, ao mesmo tempo, não pode ignorar que elas estão atormentadas pela incerteza sobre o retorno de seus maridos. Ignorar esse ponto traria prejuízos ao roteiro de Rachel Tunnard e Rosanne Flynn.

Como mencionei, o que impede o filme de ser prejudicado são as atuações de Kristin Scott e Sharon Horgan. Kristin entrega uma personagem que transmite desconforto quando tenta, genuinamente, tornar o coral algo sério e não simples “clube de canto”. Já Sharon é de uma leveza indescritível para representar alguém comprometida em fazer as mulheres ignorarem os medos que as assombram. Ambas, ainda assim, lembram que em tela estão pessoas que carregam seus próprios traumas familiares – nesse ponto, a personagem de Kristin é muito mais aprofundada.

Profundidade que não encontramos nas demais. Emma Lowndes, como Annie, parece ter um excelente timing cômico, uma vez que as tiradas mais engraçadas são dela. Mas é tudo tão rápido, ela não demora para ser engolida por outros temas igualmente superficiais. Outro detalhe, sem entregar nada comprometedor: a personagem de Amy James-Kelly terá um papel fundamental na narrativa, mas sua história não é suficientemente explorada a não ser por sutilezas. Sem isso, quando chegamos no ápice de seu drama, o espectador não está conectado à personagem, comprometendo a experiência.

Gostaria também de chamar à atenção para outro detalhe técnico que não sei dizer ao certo se foi um erro de edição, ou algo proposital. Na primeira meia hora de filme, durante uma das cenas de ensaios do coral, há um corte extremamente desagradável, porque é confuso – a personagem se inclina para falar algo para sua colega, e do nada, corta. Não é incomum usar uma cena menos importante em momentos nos quais é preciso de alguma imagem para cobrir uma lacuna enquanto algo acontece fora da cena. Só que minutos depois é possível notar que a mesma cena, ou uma muito semelhante, se repete, mas agora com a conclusão da fala.

Por último, preciso compartilhar um sentimento incômodo com um elemento essencial que compõe o filme, e deveria ter sido trabalhado com mais seriedade: há uma clara “romantização” do tema. Fora algumas menções superficiais aos traumas psicológicos ocasionados pela guerra, não há qualquer questionamento sobre a necessidade ou a moralidade desses conflitos. Os soldados, que pouco aparecem, são alçados desde o início ao posto de heróis – pois combatem um inimigo estrangeiro e estranho – e não como vítimas de um sistema. Nem mesmo o trauma de Kate é utilizado com alguma pretensão nesse sentido. Por outro lado, trata-se de um tema delicado, que envolves diferentes pontos de vistas, e, portanto, seria pedir demais de Cattaneo, que em alguns momentos se enrolou fazendo apenas o básico.

Pois bem, se você não exigir muito – e se se desprender de qualquer questionamento moral e político – é bem provável que você considere um bom filme, acompanhando diversas cenas com um leve sorriso no rosto e até mesmo se emocionando com a história. A escolha das músicas deixa tudo muito mais gostoso. No fim das contas, é um filme das mulheres, cujas protagonistas regem o coral da mesma maneira que orientam a narrativa: harmonizando e unindo suas diferenças em algo maior. Uma pena que nem todas tenham tido espaço suficiente para brilhar, fazendo de Unidas pela esperança um filme apenas “bom”, e nada mais que isso.

Com distribuição da Columbia Filmes, o filme estreia dia 14 de janeiro nos cinemas das cidades de São Paulo, Fortaleza, São Luis, Natal, Recife, João Pessoa, Belém, Aracaju, Brasília, Porto Alegre, Alphaville, Guarulhos, São José dos Campos, Campinas, Jundiaí e Santos.